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Foto do escritorDaniela Amaral

A Guerra de Pandora

Atualizado: 19 de abr. de 2023



Pandora ouviu as primeiras notícias sobre o ataque da Rússia contra a Ucrânia e ficou perplexa. Nunca imaginara, em toda a sua existência, presenciar algo dessa magnitude. A imprensa narrava os acontecimentos e descrevia os horrores da guerra. A Ucrânia sofria as consequências das ações inimigas e a população padecia em meio ao caos.

Diante a tudo isso, Pandora foi tomada por uma onda de pavor que dominou a sua sanidade mental. Uma névoa escura cobriu seus olhos e ela, imediatamente, começou a delirar e a traçar planos mirabolantes de sobrevivência. Pensou em como estocaria comida e de que modo encontraria um local seguro para se esconder e se proteger até mesmo de um possível ataque zumbi. E se tudo falhasse, traçou planos de como iria utilizar o seu último recurso, na pior de todas as hipóteses seria um suicídio coletivo em família. Afinal, sofria só de pensar em ver a sua filha passar por todo tipo de privação.


Depois de algum tempo em meio aos seus desatinos apocalípticos, percebeu o tamanho do seu exagero. Afinal os humanos eram uma raça evoluída, provida de amor ao próximo e não se deixaria ser destruída tão facilmente. Parou seus pensamentos trágicos e teve certeza de que tudo não passava de um delírio sem sentido. E então, rezou, orou e rogou. Pediu pelo fim da sua dor. Suplicou fervorosamente para ser poupada. Pandora não podia perder tudo e todos que amava. Pediu a Deus pela salvação dos inocentes, crente de que ela própria era um deles. Implorou por paz. Sabia, com certeza, que a dita guerra não era problema seu ou da sua família e, portanto, eles tinham direito a salvação.


Queria continuar vivendo a sua vida insignificante, com seus planos medíocres; sentada em seu confortável sofá, diante da sua televisão de 80 polegadas, que acabara de pagar depois de doze longas prestações. Não podia perder o seu sinal de Wi-Fi de 300 megas, o qual havia assinado a fim de assistir a sua série favorita, aquela cuja menina viaja a Paris para viver uma vida de sonhos, regada a champanhe e a croissants. Desprezava a guerra, pois, segundo ela, a pior das consequências era o aumento do preço gasolina e, provavelmente, do biscoito recheado. Tudo isso por causa de um país que ela nem sabia ao certo onde ficava.


Para ela, a sua vida já era dura o suficiente. Tinha certeza de que era soberana em matéria de sofrimento, pois precisava acordar cedo todos os dias para trabalhar. Atravessava o trânsito caótico da cidade em seu carro popular, o qual julgava ser uma carroça de pior qualidade. Ela sabia que era merecedora da providência divina e que Deus havia de salvá-la de algum modo.


Pobre Pandora, nas suas alucinações de egocentrismo, nem percebeu que ela mesma assassinará o único dom de bondade que havia restado na caixa: tomara a esperança somente para si e a transformará em puro egoísmo.


Daniela Amaral



Revisão textual: Jhenyffer Nareski Correia - @j.nareski





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